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Foto do escritorManuela Paraíso

Presunhos para que te quero | Dewclaws: are they needed?


Alguns acreditam que são indispensáveis ao Cão da Serra da Estrela para o desempenho do seu trabalho de protecção de rebanhos em terrenos íngremes, pedregosos e escorregadios. Outros afirmam que, a par da máscara e do céu-da-boca preto, são prova de pureza na raça. No primeiro estalão da raça, publicado em 1934, eles foram considerados obrigatórios, condição que foi posteriormente alterada. Há, no entanto, muitos criadores que os consideram prejudiciais e os eliminam nos primeiros dias de vida dos cachorros. O que são os presunhos ou esporões e que importância têm, de facto, nos membros posteriores? Até que ponto são úteis? Que consequências indesejáveis poderão ter no bem-estar dos cães?

O presunho é um dedo (ou unha) adicional, geralmente implantado na face interna da pata, mais alto que os dedos e ligada ao metacarpo ou ao metatarso por um osso, um tendão ou simplesmente por pele. Subsiste como vestígio e herança de tempos muito remotos, ancestrais, em que os seus antepassados possivelmente trepariam a árvores, necessitando para isso de um dedo oponente em todos os membros. A maioria dos canídeos tem-nos bem firmados nos membros anteriores, dando-lhes maior tracção no trote e galope e ajudando-os a segurar ossos e objectos para roer, e alguns cães, especialmente os de montanha e molossóides, possuem-nos também nos posteriores. Em muitos casos, os presunhos estão ligados aos posteriores por uma falange ou um tendão, sendo bem desenvolvidos e não afectando a mobilidade, especialmente se estiverem direccionados para a frente, podendo eventualmente ajudar a estabilizar o movimento do cão. Pelo menos assim o crêem muitos pastores e criadores de gado, que consideram o presunho um elemento indispensável, apesar de não haver estudos técnicos que comprovem de facto essa eficácia e funcionalidade.

No entanto, a forma como estão implantados e a sua orientação podem fazer toda a diferença, especialmente no caso de presunhos duplos (ou até mesmo triplos) - em que, por norma, o segundo, além de ser inútil, porque ligado ao primeiro geralmente só por pele, costuma estar virado para o outro metatarso. Quando o cão possui, nos posteriores, dois presunhos duplos e o segundo de cada um deles está virado para o da outra pata, eles poderão tender a enganchar-se em objectos como correntes ou tapetes ou mesmo um no outro (nalguns casos, de sabugos mais curtos, isso poderá ser evitado se se mantiver as unhas dos presunhos convenientemente aparadas, mas isso nem sempre resolve o problema); nessa circunstância, o animal poderá magoar-se seriamente, rasgando a pele, o que tenderá a gerar uma infecção, e irá provavelmente adquirir uma postura defensiva para evitar que os presunhos se toquem, podendo dar origem a deformações osteoarticulares. Uma delas, habitualmente referida pela designação inglesa “metatarsal rotation” e muito comum em raças gigantes com presunhos duplos, é uma torção do osso central do tarso que em casos graves requer cirurgia. É por isso compreensível e desejável que alguns presunhos, se formados apenas por pele e unha e muito salientes, sejam removidos cirurgicamente, para não afectarem a qualidade de vida do cão.

Assim sendo, a eterna discussão sobre a importância dos presunhos no Cão da Serra da Estrela, tal como em qualquer raça de cães de montanha, deverá sempre considerar e ponderar todas estas possibilidades. Os que defendem a sua obrigatoriedade na raça alegando razões de funcionalidade deveriam reflectir sobre a inexistência deles em todos os canídeos selvagens. Tratando-se duma sábia intervenção da Mãe-natureza para dotar o cão de gado de maior adaptabilidade ao meio, por que razão é o Lobo, seu ancestral inimigo no mesmo território, naturalmente destituído desse “apetrecho”? É que os únicos casos conhecidos de lobos com presunhos são comprovados descendentes de híbridos com cães.

Na inexistência de informação disponível fiável sobre o modo de hereditariedade dos genes que determinam os diversos tipos de presunhos (diferentes estudos genéticos efectuados apresentaram conclusões opostas) e tendo em conta que progenitores com presunhos simples poderão gerar filhos com presunhos duplos disfuncionais, a inclusão desta característica física como elemento obrigatório dum qualquer programa de criação e selecção da raça deverá suscitar reflexão e cautela, devido ao risco de, involuntariamente, se seleccionar também para eventuais problemas osteoarticulares. Por outro lado, existindo no Cão da Serra da Estrela, como em qualquer outra raça, predisposição para alguns problemas de saúde hereditários, não será muito mais lógico e benéfico, num programa de criação e melhoramento, eleger como um dos critérios prioritários o controlo desses problemas que poderão ser letais ou afectar seriamente a qualidade de vida do cão, em vez de uma opção subjetiva como a preservação dos presunhos, resultante de uma impressão meramente empírica, não comprovada tecnicamente? É que, ao excluir da reprodução exemplares típicos, saudáveis, funcionais e com carácter adequado, simplesmente por não possuírem presunhos, estar-se-á a restringir diversidade genética e a, utilizando um chavão bem ilustrativo, “deitar fora o bebé juntamente com a água do banho”.

Some believe that they are indispensable for the Estrela Mountain Dog to perform their work protecting herds on steep, rocky and slippery terrain. Others claim that, along with the mask and the black palate, they are proof of purity in the breed. In the first breed standard, published in Portugal in 1934, they were considered mandatory, condition that was later changed. There are, however, many breeders who consider them harmful and eliminate them in the first days of the dogs' lives. Just what are dewclaws and what importance do they have in hind legs? How useful are they? What undesirable consequences might they ring to the welfare of dogs?

The dewclaw is a thumb (or nail), usually implanted on the inside of the paw, higher than the fingers and attached to the metacarpus or metatarsus by a bone, tendon or simply by skin. It survives as a vestige and inheritance from ancient times, when the dogs' ancestors possibly climbed trees, needing an opposing finger in all its members. With most canids, they're firmly set in the fore limbs, giving them greater traction in trotting and galloping and helping them to hold bones and objects to chew. Some dogs, especially mountain and molossoid ones, also have them in the hind legs. In many cases, dewclaws are attached to the hind ones by a phalanx or a tendon, being well developed and not affecting mobility, especially if they are directed forward, and may eventually help to stabilize the dog's movement. At least that is what many shepherds and cattlemen believe, considering them to be an indispensable element, although there are no technical studies that actually prove this effectiveness and functionality.

However, the way they are implanted and their orientation can make all the difference, especially in the case of double (or even triple) dewclaws - where, as a rule, the second, besides being useless, because connected to the former generally by skin alone, is usually facing the other metatarsus. When the dog has two double dewclaws and the second of each facing the other paw, these may tend to hook in objects such as chains or carpets or even in one another (in some cases, this can be avoided by keeping its nails properly trimmed, but this does not always solve the problem); in this circumstance, the animal may be seriously injured, tearing the skin, which may cause an infection, and will probably acquire a defensive posture to avoid dewclaws to touch each other, which may lead to bone and joint deformations. One of them, called metatarsal rotation and very common in giant breeds with double dewclaws, is a torsion of the tarsus' central bone, and in severe cases requires surgery. It is therefore understandable and desirable that some dewclaws, if formed only by skin and nail and very protruding, should be removed surgically so as not to affect the dog's welfare.

Therefore, the eternal discussion about the importance of dewclaws in the Estrela, as in any breed of mountain dogs, should always consider and ponder all these possibilities. Those who defend they should be mandatory in the breed claiming reasons of functionality should reflect on why all wild canids lack it. Being a wise intervention by Mother Nature to give the cattle dog more adaptability to the environment, why on earth is the Wolf, their ancestral enemy in the same territory, naturally deprived of this "tool"? The fact is, the only known cases of wolves with dewclaws descend from wolf-dog hybrids.

In the absence of reliable information on the mode of inheritance of the genes that determine the various types of dewclaws (different genetic studies carried out opposite conclusions) and considering that parents with simple dewclaws can produce offspring with dysfunctional double dewclaws, the inclusion of this trait as a mandatory element in any breeding program should arouse reflection and caution, due to the risk of involuntarily selecting also for possible bone and joint problems. On the other hand, since there is a tendency in the Estrela (just like in any other breed) to some hereditary health issues, isn't it much more logical and beneficial to choose, as a priority criterion in a breeding and bettering program, to control those problems that may be lethal or seriously affect the dog's welfare, rather than a subjective criterion such as preservation of dewclaws, result of a merely empirical impression, not technically proven? By excluding from breeding typical, healthy, functional specimens with adequate temperament simply because they do not have dewclaws, genetic diversity will be restricted and the baby will be thrown out with the bath water.

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